Aos 22 anos de carreira, Leonardo Gonçalves
decidiu fazer uma pausa e agora planeja dedicar-se a outras atividades. (Foto:
Guiame)
O músico falou com exclusividade ao Guiame sobre as
possibilidades para essa pausa em sua carreira solo, sua insatisfação pessoal
com a chamada "cultura do selfie" e assegurou que não pretende dar
fim à sua relação com a música.
"Tem tanta gente dando opinião. A gente está vivendo
com o excesso de informação". A declaração dada pelo cantor e compositor
Leonardo Gonçalves revela uma impressão que ele já vem sentindo sobre o uso das
mídias sociais há algum tempo.
Assumindo estar desgastado e precisando de um pausa na
carreira que seguiu até aqui, o músico falou com exclusividade ao Guiame sobre
planos de novas atividades durante esse hiato, sua insatisfação pessoal com a
chamada "cultura do selfie" e assegurou que sua relação com a música
não acabará.
São 14 anos de carreira solo e 22 anos ao total - também
participando de grupos vocais - o que o cantor destaca como uma
"oportunidade dada por Deus", de compartilhar o seu talento com um
número surpreendente de pessoas. Porém Leonardo também lembrou que toda
profissão tem seu lado desgastante e apontou a exposição da imagem, como um
exemplo disso para a carreira artística nos dias atuais.
"A partir do momento em que a minha opinião sobre
qualquer coisa se torna tão importante, aí eu estou me colocando em um patamar
que nenhum ser humano merece estar", destacou.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Portal Guiame: Quando você anunciou sua decisão por essa
pausa, também falou sobre uma certa insatisfação com a chamada "cultura do selfie". Teve
algum momento em que você percebeu a "gota d'água" para isso tudo ou
foi uma junção de fatores que te levou a esta decisão?
Leonardo Gonçalves: Na verdade, parece que foi uma coisa
espontânea, mas que eu acho que estou precisando dessa pausa e já estou
sentindo isso há muito tempo. Como cantor solo, eu já estou na estrada há 14
anos e seu eu contar o tempo com grupos, eu completo 22 anos este ano, viajando
e cantando nas igrejas. Isso é uma coisa maravilhosa. A vida que eu tenho é
maravilhosa. A oportunidade que Deus me concedeu de compartilhar as minhas
ideias e o meu dom com tantas pessoas... eu nunca imaginei que um dia fosse
alcançar tantas pessoas e sou profundamente grato por isso. Mas por outro lado
- sem querer soar como ingrato - também é cansativo. Dependendo da
personalidade de cada um, as pessoas reagem de uma ou de outra maneira às
coisas que cansam. Evidentemente, em cada trabalho - não importa se é na área
da música, como advogado, como médico, existem as partes do trabalho com as
quais você mais se identifica e existem as partes do trabalho com que você não
se identifica tanto.
Para mim, por causa da minha personalidade, é
particularmente difícil a questão da exposição da imagem... talvez nem seja a
exposição imagem, mas sim o uso da imagem de "maneira promocional".
Porque hoje tudo gira em torno da imagem. Eu não acho isso errado, mas é uma
coisa que me desgasta. De maneira geral eu tenho um problema com a
autopromoção. Basicamente no meu Instagram, a minha equipe teve que me forçar a
divulgar pelo menos as minhas agendas, a criar banner. Mas quando eu fui criar
banner de agenda, fui atrás do designer que faz as artes do meu CD, do
fotógrafo que tira as fotos para mim, para ter uma coisa de qualidade que fosse
artística.
Uma coisa besta, por exemplo, que eu não faço - até faço no
Loop Session & Friends, mas na minha carreira eu não faço - é que sempre
quando você está cantando em uma igreja, em um teatro ou auditório cheio, a
galera tira foto ou faz snapchat... o cantor com o público para mostrar para os
contratantes que a casa está cheia e isso vai gerar
outros convites... Eu não acho isso errado, mas eu não
consigo fazer assim. A algumas coisas eu consigo me adaptar, outras eu acho um
pouco mais difíceis. Eu amo cantar, eu não tenho nenhuma mágoa com a indústria,
com a gravadora, com o povo... não é nada disso. Realmente é que eu estou há 22
anos fazendo a mesma coisa, mais ou menos do mesmo jeito, baseado nos mesmos
princípios. Isso acabou crescendo muito, aumentando muito, com muita
visibilidade e eu senti que esse é o momento em que eu posso fazer isso [dar
uma pausa], por mais estranho que isso soe.
Portal Guiame: Há planos sobre o que pode ser feito nesse
período de pausa na carreira?
Leonardo Gonçalves: Eu assisti a um sermão do presidente da
Igreja Adventista na América do Sul - A Igreja Adventista está investindo
bastante nessa cultura de voluntariado - e ele falou assim: "Você que é um
profissional liberal e pode tirar um ano, dedicar-se ao voluntariado..." e
aí eu me senti tocado quando ele. Eu sempre quis
fazer um tempo sabático e ser útil. Eu não quero dar um
tempo e não fazer nada... eu quero fazer uma outra coisa.
Teve uma época da vida de Albert Einstein que ele precisava
descansar a mente, para que ele pudesse continuar trabalhando os problemas da
Física que ele estava resolvendo. Então ele arrumou um emprego totalmente nada
a ver... alguma coisa na qual ele trabalhasse com as mãos e que ele não
precisasse tanto o cérebro para aquela área. É mais ou menos esse o princípio:
se for para continuar a fazer o que eu estou fazendo, eu preciso descansar,
definitivamente, senão isso vai começar a me afetar em um nível que talvez não
seja saudável para mim. Ao mesmo tempo, há um grande risco, porque se eu tirar
um ano, um ano e meio, dois anos, morando no exterior - atualmente toda a minha
família reside no exterior desde 2012 - eu posso me encaminhar por lá e
simplesmente não voltar.
Dificilmente eu vá parar de cantar, porque é algo que eu
gosto muito de fazer. Mas eu acho que se eu for voltar para o Brasil, para
continuar o meu ministério, vou aproveitar para mudar algumas coisas. Talvez me
poupar mais em alguns sentidos, readaptar algumas coisas para continuar o que
eu estou fazendo, da maneira que eu estou fazendo.
Imagem do DVD "Princípio - Ao Vivo", lançado por
Leonardo Gonçalves em parceria com a Sony Music, em 2014. (Imagem: Sony Music
Gospel)
Portal Guiame: Poderíamos dizer que você está tomando esta
decisão antes que chegasse a se arrepender?
Leonardo Gonçalves: Eu não creio que chegaria a me
arrepender, porque eu tenho plena convicção de que, até aqui, quem me guiou foi
o Senhor. Todos os passos que eu dei, o fiz com bastante segurança. Mas é
importante lembrar também - já que estamos levando a coisa para o lado
espiritual - que não está acontecendo algo assim: "Deus me deu o
direcionamento que eu deveria parar" ou que "Deus me apareceu em
sonho"... Não é uma coisa mística. Eu estou identificando há tempos que
estou precisando de um tempo de descanso para mim e Deus é misericordioso. Por
enquanto , Ele está me sinalizando que vai me permitir fazer isso [risos].
Portal Guiame: Essa cultura de exposição nas mídias sociais
é algo que faz parte da sociedade atual e é o meio pelo qual os cantores /
artistas se divulgam. Você acredita que uma pessoa pública consiga divulgar o
seu trabalho sem entrar em um clima paranóico sobre isso?
Leonardo Gonçalves: Na verdade, a culpa do assassinato não é
da faca. Nao há nada de errado na internet, nas redes sociais e eu também não
sei se o ser humano está mudando por causa disso. Eu acho que ele apenas está
explicitando e demonstrando traços que já havia na humanidade há muito mais
tempo. No fundo, no fundo, cada um tem que decidir para si, o que é preciso
fazer para manter a sua sanidade, seja ele (a) uma pessoa pública ou não. Vou
dar um exemplo: Tenho muitos amigos que têm filhos pequenos. Alguns deles não
publicam nenhuma foto dos filhos, não tem nenhum registro digital dos seus
filhos. Já outros, qualquer coisa, qualquer momento, registram e publicam. A
criança está o tempo inteiro exposta, estando em idades que a criança não tem
escolha. Não tem como dizer que se ela quer, se ela gosta ou não disso. São os
pais que decidem e cada indivíduo tem que decidir como proceder. O que eu acho
que precisa acontecer é que essas decisões precisam ser conscientes. Se as
decisões forem conscientes, isso já valida muito as decisões que são tomadas
nessa área.
Como muitas coisas, realmente são novidades, as pessoas não
param muito para pensar no que elas estão fazendo. Vou dar o exemplo aqui do
Twitter, que já passou. Mas logo que surgiu o Twitter, eu tenho um primo que
escrevia assim: "Bom, galera... Vou lá tomar um banho e já volto". É
um tipo de informação totalmente desnecessária. O seu amigo que entrou no
Instagram, por exemplo... Comprou o smartphone novo e faz postar 20 fotos em 24
horas. Isso é normal. Não estou nem criticando isso. Mas leva-se um tempo até
criar o equilíbrio daquilo que é socialmente aceito dentro daquela mídia.
Outra coisa engraçada hoje em dia é que todo mundo tem
opinião sobre tudo. O mundo que a gente vive hoje acabou produzindo - e isso é
um efeito, também, um pouco do BBB, com os vlogger's, os blogger's - um monte
de celebridades online, gente que tem milhões de seguidores e ninguém sabe ao
certo o que eles fazem. São "influencer's" (influenciadores). Não
estou nem dizendo que não há valor neles, que eles não dão nenhuma
contribuição, mas eu tive essa conversa com uma amiga que é vlogueira e ela me
falou que tinha que ter um vlog para falar inclusive sobre essas minhas
opiniões que estou colocando aqui, agora, as minhas críticas. A minha resposta
para ela foi: "Sinceramente, a minha opinião não é tão importante".
Tem tanta gente dando opinião. A gente está vivendo com o excesso de
informação. Muita gente argumenta comigo: "Os jovens precisam de
referência". Mas eu não me sinto chamado para isso. A partir do momento em
que a minha opinião sobre qualquer coisa se torna tão importante, aí eu estou
me colocando em um patamar que nenhum ser humano merece estar.
A minha opinião não merece ser ouvida porque eu tenho um
número X de seguidores e, se isso é motivo suficiente para influenciá-los,
dando opinião a respeito de assuntos que eu não tenho a mínima noção do que
estou falando. Hoje em dia temos tantos cursos sobre como falar em público,
cursos de liderança, de autoconfiança, mas o que está faltando é um pouco de
auto desconfiança. Não tem nada de errado você se posicionar. Eu mesmo sou uma
pessoa cheia de convicções, mas tenho poucas certezas e isso me ajuda a viver.
Eu sou uma pessoa convicta sobre uma série de coisas, mas eu não tenho certeza absoluta
sobre quase nada. Por quê? Porque essas certezas absolutas são muito perigosas
para o próprio indivíduo e, talvez para a sociedade, como consequência disso.
FONTE: GUIAME, POR JOÃO NETO
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