Um editorial publicado nesta quarta-feira (8) no El País afirma que Michel
Temer “inaugura a república evangélica.” O editorialista Luiz Ruffato comenta a
aliança do presidente-interino com alas mais fundamentalistas cristãs inseridas
na política brasileira.
Segundo a reportagem, o PT flertou com os evangélicos ao longo dos mandatos do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente afastada Dilma
Rousseff. Não fosse o engajamento de pastores e bispos das igrejas
pentecostais, provavelmente o partido não teria ganhado quatro eleições
seguidas. E para garantir esse apoio, os petistas abriram mão de compromissos
históricos, principalmente aqueles relacionados à luta pelos direitos das
minorias (mulheres, homossexuais, negros e índios), concentrando esforços na
melhoria das condições de vida da população pobre, também público-alvo dos
pentecostais. De qualquer maneira, os governos Lula e Dilma, ainda que reféns
dos evangélicos, mantiveram uma agenda propositiva no campo social.”
El País destaca que como se não bastasse a vexaminosa performance do presidente
interino Michel Temer – dois ministros demitidos em apenas 19 dias, por
envolvimento com denúncias de corrupção – é em seu governo que os religiosos
vêm conquistando espaço inédito na história da República.
O jornal espanhol fala que de acordo com o registro na Câmara dos Deputados, a
Frente Parlamentar Evangélica – que inclui católicos, protestantes e
pentecostais - conta hoje com a participação de 199 membros (39% do total da
Casa) e quatro senadores. O primeiro compromisso oficial de Michel Temer, como
presidente interino, foi receber alguns membros da bancada evangélica, que o
cumprimentaram e oraram por ele. Temer nomeou para o Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior o presidente do Partido
Republicano Brasileiro (PRB), Marcos Pereira. Bispo da Igreja Universal do
Reino de Deus, Pereira é homem de confiança de Edir Macedo – foi diretor
administrativo e financeiro da TV Record do Rio de Janeiro entre 1995 e 1999, e
vice-presidente da Rede Record de Televisão, entre 2003 e 2009. A bancada do
PRB conta com 19 deputados federais, entre eles, o controverso Celso
Russomanno, pré-candidato à Prefeitura de São Paulo. A igreja de Edir Macedo
elegeu sozinha sete deputados federais e um senador, Marcelo Crivella (RJ).
El País acrescenta que para o Ministério do Trabalho, o presidente interino convidou
o deputado federal pelo Rio Grande do Sul, Ronaldo Nogueira. Nogueira é pastor
da Assembleia de Deus, igreja que possui a maior bancada entre os evangélicos -
19 membros da Câmara dos Deputados estão ligados a ela, além do senador Gladson
Camelli (AC), que, embora não pertença aos quadros, elegeu-se com seu apoio. Os
membros mais destacados da Assembleia de Deus são os deputados Marco Feliciano
(PSC-SP), que em sua rápida passagem pela presidência da Comissão dos Direitos
Humanos e Minorias, demonstrou toda a sua homofobia; e as deputadas Cantora
Lauriete (PSC-ES), famosa por seu recente casamento com o também evangélico
senador Magno Malta (PR-ES) – relação vista com maus olhos pelos seus pares já
que ambos são divorciados - e Fátima Pelaes (PMDB-AP). Não só isso, Fátima
Pelaes foi nomeada por Michel Temer secretária de Políticas para as Mulheres,
órgão subordinado ao Ministério da Justiça. Ela é investigada pela Justiça
Federal por denúncias de envolvimento em um esquema que desviou 4 milhões de reais
de verbas do Ministério do Turismo para capacitação de profissionais em seu
estado. Além disso, ocupando uma pasta que tem como objetivo implementar
políticas destinadas à mulher, Fátima já disse que, por conta de suas
convicções religiosas, é contra o aborto (uma reivindicação antiga dos
movimentos sociais), mesmo em casos de estupro, direito esse que já é garantido
pela legislação.
Para finalizar o jornal El País afirma que para líder da bancada governista na
Câmara, Temer designou o deputado federal André Moura, que, embora católico,
está filiado ao PSC, partido de maioria evangélica, presidido pelo pastor
Everaldo Pereira, importante membro da Assembleia de Deus, e que abriga o
pré-candidato à Presidência da República, o fascista deputado federal Jair
Bolsonaro (RJ). Moura é autor da Proposta de Emenda Constitucional que diminui
a idade penal de 18 para 16 anos – aprovada pela Câmara e em análise no Senado
– e da proposta que criminaliza quem induzir ou instigar a gestante a praticar
aborto e dificulta o aborto mesmo em casos de estupro. Moura é homem de total
confiança do deputado afastado Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, réu no
Supremo Tribunal Federal (STF) em processo por crimes de corrupção passiva e
lavagem de dinheiro. O líder do governo na Câmara também é réu em três ações
penais no STF sob acusação de desvio de dinheiro público e é investigado em
três outros inquéritos por suposta participação em uma tentativa de homicídio e
no esquema de corrupção da Petrobras.
Confira abaixo a íntegra do editorial:
*Luiz Rufato
O PT flertou com os evangélicos ao longo dos mandatos do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e da presidente afastada Dilma Rousseff. Não fosse o
engajamento de pastores e bispos das igrejas pentecostais, provavelmente o partido
não teria ganhado quatro eleições seguidas. E para garantir esse apoio, os
petistas abriram mão de compromissos históricos, principalmente aqueles
relacionados à luta pelos direitos das minorias (mulheres, homossexuais, negros
e índios), concentrando esforços na melhoria das condições de vida da população
pobre, também público-alvo dos pentecostais. De qualquer maneira, os governos
Lula e Dilma, ainda que reféns dos evangélicos, mantiveram uma agenda
propositiva no campo social.
No entanto, não bastasse a vexaminosa performance do presidente interino Michel
Temer – dois ministros demitidos em apenas 19 dias, por envolvimento com
denúncias de corrupção – é em seu governo que os religiosos vêm conquistando
espaço inédito na história da República. Segundo registro na Câmara dos
Deputados, a Frente Parlamentar Evangélica – que inclui católicos, protestantes
e pentecostais - conta hoje com a participação de 199 membros (39% do total da
Casa) e quatro senadores. O primeiro compromisso oficial de Michel Temer, como
presidente interino, foi receber alguns membros da bancada evangélica, que o
cumprimentaram e oraram por ele.
Temer nomeou para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior o presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB), Marcos Pereira.
Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, Pereira é homem de confiança de
Edir Macedo – foi diretor administrativo e financeiro da TV Record do Rio de
Janeiro entre 1995 e 1999, e vice-presidente da Rede Record de Televisão, entre
2003 e 2009. A bancada do PRB conta com 19 deputados federais, entre eles, o
controverso Celso Russomanno, pré-candidato à Prefeitura de São Paulo. A igreja
de Edir Macedo elegeu sozinha sete deputados federais e um senador, Marcelo
Crivella (RJ).
Para o Ministério do Trabalho, o presidente interino convidou o deputado
federal pelo Rio Grande do Sul, Ronaldo Nogueira. Nogueira é pastor da
Assembleia de Deus, igreja que possui a maior bancada entre os evangélicos - 19
membros da Câmara dos Deputados estão ligados a ela, além do senador Gladson
Camelli (AC), que, embora não pertença aos quadros, elegeu-se com seu apoio. Os
membros mais destacados da Assembleia de Deus são os deputados Marco Feliciano
(PSC-SP), que em sua rápida passagem pela presidência da Comissão dos Direitos
Humanos e Minorias, demonstrou toda a sua homofobia; e as deputadas Cantora
Lauriete (PSC-ES), famosa por seu recente casamento com o também evangélico
senador Magno Malta (PR-ES) – relação vista com maus olhos pelos seus pares já
que ambos são divorciados - e Fátima Pelaes (PMDB-AP).
Fátima Pelaes foi nomeada por Michel Temer secretária de Políticas para as
Mulheres, órgão subordinado ao Ministério da Justiça. Ela é investigada pela
Justiça Federal por denúncias de envolvimento em um esquema que desviou 4
milhões de reais de verbas do Ministério do Turismo para capacitação de
profissionais em seu estado. Além disso, ocupando uma pasta que tem como
objetivo implementar políticas destinadas à mulher, Fátima já disse que, por
conta de suas convicções religiosas, é contra o aborto (uma reivindicação
antiga dos movimentos sociais), mesmo em casos de estupro, direito esse que já
é garantido pela legislação.
Finalmente, para líder da bancada governista na Câmara, Temer designou o
deputado federal André Moura, que, embora católico, está filiado ao PSC,
partido de maioria evangélica, presidido pelo pastor Everaldo Pereira,
importante membro da Assembleia de Deus, e que abriga o pré-candidato à
Presidência da República, o fascista deputado federal Jair Bolsonaro (RJ).
Moura é autor da Proposta de Emenda Constitucional que diminui a idade penal de
18 para 16 anos – aprovada pela Câmara e em análise no Senado – e da proposta
que criminaliza quem “induzir ou instigar a gestante” a praticar aborto e
dificulta o aborto mesmo em casos de estupro. Moura é homem de total confiança
do deputado afastado Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, réu no Supremo
Tribunal Federal (STF) em processo por crimes de corrupção passiva e lavagem de
dinheiro. O líder do governo na Câmara também é réu em três ações penais no STF
sob acusação de desvio de dinheiro público e é investigado em três outros
inquéritos por suposta participação em uma tentativa de homicídio e no esquema
de corrupção da Petrobras.
O fundamentalismo evangélico – com seu moralismo hipócrita – conta com toda a
simpatia do presidente interino Michel Temer. Corremos o risco de, com seu
apoio, vermos ruir mesmo aquelas modestas paredes levantadas ao longo das três
décadas da nossa débil democracia.
Fonte: El País e Jornal do Brasil
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